quarta-feira, 23 de setembro de 2009

LEITURA de PEÇAS no Cosme Velho





O Casarão de Austregésilo de Athayde promove, às terças-feiras de setembro e outubro, a série Ciranda em Cena – rodas de leitura conduzidas por atores e autores teatrais.
O evento terá início às 20h30 e a entrada é franca.




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Cirandeiros em Cena
22/09 – Hamilton Vaz Pereira
29/09 – Sandra Bonadeus
06/10 – Lucília de Assis
20/10 – Veronica Diaz
27/10 – Roberto Athayde
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Casarão de Austregésilo de Athayde
Rua Cosme Velho, nº 599
Telefone: 2265 3536
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mal dosado

Coitado do Timóteo. Mas também, quem mandou casar ? Agora a mulher quer voltar a trabalhar. Ele sofre como louco, não quer deixar. O pessoal bem que avisou, não era pra casar. Ah, mas o Timóteo apaixonou. Também não era pra apaixonar...
Hoje ele põe a culpa no Amarante. Não, não foi ele que apresentou os dois, mas diz que o amigo é que lhe pôs essa ideia na cabeça. Que ele, crente, e ainda por cima, da polícia, jamais pensaria em estar com uma delas, quanto mais conversar.
Quando a primeira esposa fugiu com outro, o Timóteo caiu em depressão profunda e nunca mais quis saber de mulher alguma. Bebia sozinho, desvairadamente, até o dia em que o Amarante o reconheceu na saída de uma birosca. Engrenaram no papo, as lembranças do tempo de ginásio, o jogo de bola, as meninas e tal. Vendo o outro meio macambúzio, Amarante sugere uma visita ao bordel. Apesar da negativa inicial, a insistência do amigo, a solidão e o seu atraso nessa área acabaram vencendo os pudores da religião e da profissão.
Já na mesinha do salão, enquanto Amarante se divertia com a falsa loura, o amigo tristonho e mudo deixava a morena em ponto morto, constrangida, até.
Ao descerem do quarto às gargalhadas, Amarante e a loura dão com a cara séria do Timóteo, que só quer sair dali o mais rápido possível.
- Mas o que é que houve ? A moça não...?
- Não, é que esse tipo de mulher...Depois isso de ter que pagar...
Ao que o Amarante responde, com todo o seu carinho paternal:
- Meu amigo, essas moças... elas são moças, também, você sabia ? São filhas e mães e irmãs, ora... Estão batalhando pela vida. Você tem que conversar com elas...
- Mas fazer amizade ?
- É, por que não ? Até pra poder se divertir...
E sugestivamente acrescentou:
- Ó, elas sempre me dão muito mais do que eu peço...Depois, não custa nada ser gentil...
Coitado do Timóteo. Ele ouviu. Obedeceu.
Semana seguinte lá está ele no bordel de papo com a mulata. E na outra semana, e depois, e no outro dia, e ... Pronto, lá vai o policial entrando acompanhado no cinema, e no parquinho, e na igreja.
Coitado. Mas também, quem mandou casar ? Agora a mulher não se aguenta em casa e quer voltar a trabalhar. Ele sofre como louco, imagina, policial com mulher na zona!
Ah, mas quem mandou ? Não era pra casar, era só pra conversar!
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quarta-feira, 16 de setembro de 2009

algo está fora da ordem (artigo publicado no JB em 14/09/09)

Perguntada a respeito de trabalho e família, a moça respondeu, meio sem pensar: “Tudo em ordem. Por enquanto”.
Ora, tudo na vida é “por enquanto”. A própria vida só é “por enquanto”, efemeridade que nos leva ao desejo mais do que justo de alongá-la. E que nos traz perplexidade sempre que é interrompida. Quando essa interrupção se dá precocemente, com mais razão ainda nos indignamos. Mas, de modo geral, principalmente nos casos de acidentes e doenças, em que a morte é muitas vezes atribuída a “causas naturais”, acabamos tendo que nos conformar e considerar essas perdas como “fatalidade”.
No entanto, quando a vida de um jovem é interrompida pela ação violenta de um outro ser humano, e por um motivo absolutamente torpe, esta morte não pode ser considerada “natural” e não podemos deixar de sentir revolta e indignação, não podemos nos conformar. Frente à notícia de que um rapaz de 15 anos foi morto por causa de um celular, não é possível aceitar nem o discurso da “fatalidade”, nem a explicação oficial dada para outros fatos recentes, de que se trata de uma “resposta dos traficantes às ocupações dos morros do Rio”.
Se, neste mês de setembro, o conjunto de atos violentos – arrastão no Túnel Zuzu Angel, tentativa de arrastão no Túnel Velho, sequestro e tentativa de assalto em Copacabana, repressão à manifestação dos professores, assalto com reféns à Igreja de Sant'Ana – é, por si só, assustador, a morte de Luiz Gabriel de Jesus Correia, assassinado em Bangu quando ia a uma festa organizada pela igreja, aparece como sintoma da barbárie.
Quanto custa um celular? Quanto custa uma vida?
“As pessoas estão morrendo a troco de nada. Perdeu-se a noção do que vale a pena e do que não vale”, desabafou o pai do jovem.
A falta de uma resposta firme por parte das autoridades competentes e a inexistência de um movimento coletivo contra o descalabro constituído por essa realidade, além do sentimento de que a questão da segurança fugiu do controle, nos trazem a terrível certeza de que algo muito sério está fora da ordem. E que diz respeito ao valor que atribuímos à vida.
Priorizar a vida implica em rever a importância das pessoas e dos objetos; solicita maior participação em ações coletivas, exige escolher melhor em quem votar e cobrar resultados. Da parte dos governantes, priorizar a vida passa por medidas que promovam efetivamente a paz e a justiça, com a redução das desigualdades, a melhoria dos serviços públicos, a democratização do acesso aos bens culturais, a agilização da Justiça, o controle da venda de armas, o treinamento de uma polícia bem equipada.
É preciso urgentemente construir um caminho que nos permita chegar um pouco mais perto daquilo que o Dicionário Aurélio oferece para o verbete PAZ:
1. Ausência de lutas, violências ou perturbações sociais; tranqüilidade pública; concórdia, harmonia.
2. Ausência de conflitos entre pessoas; bom entendimento; entendimento, harmonia.
3.Ausência de conflitos íntimos; tranqüilidade de alma; sossego.
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