segunda-feira, 11 de maio de 2009

camelôs e camaleões (artigo publicado no JB em 03/05/09

O espaço para a circulação dos pedestres foi ampliado, algumas barracas sumiram. A moça que vendia biscoitos a granel, numa tenda grande, agora tem um banquinho onde coloca saquinhos de 100g de biscoitos já pesados. O que antes era um balcão largo onde se vendia água de coco, agora é uma mesinha alta onde fica a serpentina - o isopor com gelo é escondido atrás da árvore, um pouco mais longe. A barraca de frutas foi substituída por um aramado com capas de DVDs e programas piratas de computador. A troca só faz sentido na lógica do “rapa”: mais fácil correr e fugir, mais leves, não perecíveis. Além disso, os discos propriamente ditos estão sempre a salvo.
A transformação lembrou-me Darwin e sua teoria: sobrevivem os que melhor se adaptam a mudanças...
Na esquina perto de casa, essas tinham sido, até ontem, as consequências visíveis do choque de ordem desencadeado pela prefeitura. Hoje, menos de 4 meses depois do seu início, a barraca de frutas está de volta.
Não há dúvida de que o espaço público precisa ser ordenado: é imperativo o cumprimento das leis e o respeito às normas de convivência urbana. Porém, no que se refere ao comércio ilegal, atitudes repressivas, apenas, não resolvem. Não adianta afirmar a ilegalidade e caçar os criminosos, sem oferecer nenhuma alternativa para o sustento legal das famílias envolvidas. A gestão anterior começou e terminou levando a guarda municipal a tristes e vergonhosas batalhas que não trouxeram avanço algum. É claro que nenhuma prefeitura pode dispor de efetivo suficiente para fiscalizar permanentemente todas as ruas, de todos os bairros. Além disso, a crise econômica e o desemprego devem ampliar o número de pessoas que buscam a sobrevivência desse modo.
Questão complexa não tem soluções simples. Se quiser de fato resolver o problema, a equipe deste governo terá que dialogar com associações de moradores, associações de lojistas e com os próprios ambulantes, para conseguir encontrar, dentro da lei, as formas mais criativas, mais benéficas para a cidade e menos lesivas para as partes envolvidas. O dado positivo é que a prefeitura parece dar sinais de abertura: há no ar uma sugestão para a transformação dos comerciantes em microempresários, o que ainda merece estudos, mas a idéia em si já traz um olhar novo, que propicia a inclusão. Também a reordenação do Largo da Carioca, no Centro, mantendo uma área onde o exercício legal dos cadastrados é possível, foi uma iniciativa diferente da repressão pura e simples. No entanto, é preciso que a definição de espaços tenha por base acordos que possam efetivamente ser respeitados. Do contrário, a infinita criatividade dos camelôs cariocas, estimulada pela necessidade de sobrevivência, poderá ser capaz de driblar todos os planos.
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