quarta-feira, 7 de outubro de 2009

sofá

Quando eles se mudaram pra casa nova, a mulher do Reginaldo inventou que queria um sofá de couro na sala.
-Mas couro de verdade, da vaca! Nada daquele plástico imitando, aquela coisa quente por baixo da perna.
-O que é que tem? Não é gostoso?
-Que, gostoso, o quê. Com esse calor que faz?
No início o Reginaldo desconversou. Fez que esqueceu. Mas virou, mexeu, ela voltava à carga. Ele argumentava, fazendo as contas da mudança:
-A gente não pode deixar pro ano que vem? Não dá pra por estofamento novo no sofá que a gente ganhou? Ainda tá inteirinho, é só trocar...
-Mas casa nova com sofá velho? Negativo. Depois, você também vai adorar, garanto.
É que ela tinha visto numa revista de decoração e depois, na casa da prima de uma amiga. Delícia de sofá, bem grande. Queria um enorme, pra poder deitar no fresquinho.
O marido falava do preço, do transporte, do espaço apertado. Mas ela não se dobrava. Ele enrolou o quanto pode, mas ela tanto insistiu que lá foi o Reginaldo pesquisar. Depois de visitar várias lojas, só confirmou o que já imaginava: o sofá saía mais caro que todos os armários embutidos. Nada feito.
-Ah, é? Então traz o sofá velho, pode trazer, que é nele que você vai dormir.
-Mas, como?
-Em mim você não toca. Então melhor dormir no sofá.
Não houve jeito. Quando chegou o sofá novo, enquanto a mulher pulava de alegria, Reginaldo parecia caminhar para o matadouro. Calculava as prestações.
Mas realmente, era lindo. Enoooorme. Podiam os dois deitar ali - e foi a primeira coisa que fizeram, depois de tanto tempo de abstinência. Valeu a pena, a satisfação da esposa o recompensou por muitas semanas.
Mudança feita, aos poucos é que foram sentindo o aperto na sala, o pouco espaço para os outros móveis, a dificuldade pra passar toda vez que queriam entrar ou sair. Com compras, então...
Mas o pior de tudo ficou mais visível quando convidaram amigos pela primeira vez: é que ela era baixinha, muito baixinha. Naquele sofá enoooorme, das duas, uma: ou ela encostava a coluna, ficando ridícula com as pernas esticadas e os pés sobre o couro, ou sentava na beirinha, pouco à vontade no esforço das costas eretas.
De alguma forma vingado, Reginaldo ria por dentro, observando pelo canto do olho a mulher sentada como uma boneca frente à TV. Ou como uma criança, que nunca deu o braço a torcer.
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Um comentário:

Anônimo disse...

Muito bom. Dá um curta-metragem.
Vêro, como é que faço para colocar no meu blog a mensagem que é proibido publicar ou copiar meus textos sem minha autorização?