quarta-feira, 11 de maio de 2011

as loucas de maio

Cheguei mais cedo numa escola onde dou uma oficina. As professoras tinham reunido umas 80 crianças no pátio para fazer uma homenagem às poucas mães que compareceram – era plena 2ª.feira à tarde, a maioria trabalha.

Primeiro foi a turma das menorzinhas, umas 10 crianças de 6 anos cantando “a capella”, timidíssimas, coitadas, quase um paredão de fuzilamento na frente de professoras, funcionários, enfim, diante de toda a escola. Então sorri, solidária. Depois da primeira vergonha, elas se soltaram um pouco mais e pudemos ouvir a delicadeza daquelas vozes, tão lindas quanto frágeis, tão tocantes justamente por sua inocência e hesitação.

A música seguinte foi cantada por todos os alunos juntos. Foi uma onda, foi inevitável: eu me  percebi ali, naquela escola pública semiabandonada, caindo aos pedaços, à beira da favela, entre crianças pobres, às vezes subnutridas, algumas de chinelos, camisas rasgadas, sujas, cantando para poucas mães, igualmente pobres e abandonadas. As poucos elas elevavam a voz, as crianças agora cantavam a plenos pulmões e embora meu senso crítico reclamasse da música cafona, a garra das professoras regendo aquele coro dos desvalidos criava uma imagem inusitada que fundia força e insanidade: essas mulheres loucas, carismáticas, que ganham pouquíssimo, me apareceram comparáveis às mães da praça de maio. São elas agora as nossas loucas da resistência, visionárias e revolucionárias; elas são hoje o reduto da mais profunda e verdadeira resistência, pois constroem sua própria existência a partir de valores completamente contrários aos da ordem capitalista vigente. Elas não têm lucro, elas não pensam no lucro, elas não pensam em competição, não sabem de marketing, não sabem do mercado, da bolsa, do euro, das ações. As loucas vivem e trabalham em condições miseráveis e  insistem em ensinar as crianças a cantar e a demonstrar afeto.  
Então foi assim que eu me peguei chorando.    
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